segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

O POEMA, A POESIA, AINDA E OUTRA VEZ

 

O escritor mexicano Octávio Paz, em seu livro “A Outra Voz”, diz que o poema é “um objeto feito de palavras, destinado a conter e segregar uma substância impalpável, rebelde a definições, chamada poesia”. De acordo com a visão do mexicano, o poema seria mais um espaço onde a poesia, se bem manipulada pelo poeta, reverbera. A poesia estaria mais ligada à ideia de aura, de força que permeia o objeto artístico seja ele qual for. Assim, a poesia depende tanto de quem cria o objeto, quanto de quem o consome. Poderíamos pensá-la como um fluxo contínuo, um fluxo que necessita de estradas para fluir. São duas as principais estradas: o artista e o o receptor, também conhecido como público, leitor, ouvinte, etc. Se o artista não alarga sua estrada com conhecimento, estudo, disciplina e, claro, um pouco de delírio, a obra ficará limitada, distante da possibilidade de expandir-se, tocar partes desconhecidas, tanto do próprio artista, quanto daquele que vai consumir a arte. Por outro lado, se o público também ficar encastelado na sua visão fixa de mundo, no seu metro quadrado de conhecimento, nada fora disso será experimentado. A obra ficará perdida, desconectada, destituída de sua principal força: a transformação daquele que tem contato com ela.

Retornando ao poema: dos tipos de textos literários, o poema é um dos mais antigos. Octávio Paz diz que esse tipo de expressão se confunde com o surgimento da própria linguagem, ou seja, o poema seria desde sempre o melhor objeto para conter a poesia. Seria, digamos, o ideal para esse trabalho, já que o poema é ritmo, e o ritmo acontece espontaneamente em toda forma verbal. Nos primórdios, o poema era confundido com a fala, por isso a sua presença constante entre as gentes, que o usavam para repassar a história e a mitologia da comunidade aos mais novos.

No entanto, o poema perdeu essa função no imaginário das pessoas. Hoje, a prosa literária cumpre essa função, ganha mais destaque, vende mais e mantém financeiramente o sistema literário. Poemas ainda possuem um certo prestígio, mas, de forma geral, são relegados àquele canto dos supérfluos, da experimentação, daquilo que poucos entendem. Também são relegados a serem os objetos artísticos criados pelos românticos inveterados, que insistem em manter o clichê de que “poesia é sentimento” e, portanto, o poema tem que vir carregado de doçuras sentimentais.

Claro, poetas, bons e ruins, continuam publicando às pencas. Os livros de poemas, bons e ruins, geralmente bancados por editais públicos, pululam por aí, quase sempre destinados à outros poetas, que lerão e escreverão outros livros de poemas, mantendo o círculo. Não sou um saudosista, nem acredito que o poema retornará àquele estágio essencial que tanto fascinou Octávio Paz. Penso que o poema continuará cada vez mais sendo o espaço em que as experiências com a linguagem possam ser as mais radicais, as mais inovadoras. Assim, enquanto houver um aspirante a poeta lendo outro poeta, o poema resistirá.

RUBENS DA CUNHA

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